Busca e apreensão com imprecisão no endereço é legítima?

CASO PRÁTICO: Juiz da Vara Criminal Federal de Curitiba expediu mandado de busca e apreensão ao escritório profissional de Tício situado no 6º andar de determinado edifício comercial. Ao chegar no prédio, os executores do mandado tiveram conhecimento que outra empresa de Tício (instituição financeira) ocupava o 3º andar, e solicitaram ao juiz substituto que autorizasse apreensão de computadores desta empresa, sem informar que se tratava de outro endereço (3º andar). Esta solicitação foi deferida mediante ofício, sem detalhamento de informações, para que fosse realizado o espelhamento dos discos rígidos dos computadores. A apreensão destes equipamentos da instituição financeira foi legítima? Qual o fundamento da sua decisão?

No HC 106566, que foi analisado pela 2ª Turma do STF, cujas partes são notoriamente conhecidas pelas Operações Satiagraha e Chacal, o Ministro Relator Gilmar Mendes entendeu que o endereço profissional também estaria protegido contra o ingresso não consentido, sem autorização judicial, na forma do art. 5º XI, da CF (inviolabilidade do domicílio), devendo os equipamentos de informática apreendidos serem devolvidos à instituição financeira.

Para o Ministro Relator, mandados de busca e apreensão não podem ter conteúdo genérico e muito menos imprecisão quanto ao local de sua realização, motivos e os fins da diligência, sob pena de ofensa ao art. 243 do CPP. Como não houve equívoco em relação à localização do endereço alvo da primeira busca, que foi facilmente identificado pelos policiais, não se sustentou o argumento de que não haveria necessidade de indicar endereço determinado para segunda.

Por fim, o Ministro Gilmar Mendes ainda explicou que um ofício não é um mandado de busca e apreensão, e não poderia ter autorizado tal medida extraordinária.

Por estas razões, a busca e apreensão realizada deve ser considerada ilegítima, e a prova considerada como ilicitamente obtida e excluída do processo, nos termos do art. 157, §3º, do CPP.

Informativo do STF de nº 771, período de 8 a 12 de dezembro de 2014.

Busca e apreensão e autorização judicial - 1

A 2ª Turma iniciou julgamento de “habeas corpus” em que se alega a nulidade de provas obtidas a partir de mandado judicial inespecífico. No caso, ao cumprir mandado de busca e apreensão que teria como alvo o endereço profissional do paciente, localizado no 28º andar de edifício, foram apreendidos dois equipamentos de informática no endereço de instituição financeira localizada no 3º andar do mesmo edifício, sem que houvesse mandado judicial para esse endereço. O Ministro Gilmar Mendes (relator) concedeu a ordem para determinar a imediata devolução do material apreendido à referida instituição financeira. De início, reconheceu a legitimidade do “habeas corpus” para aferir procedimentos de feição penal ou processual penal. Afirmou que a “casa” seria protegida contra o ingresso não consentido, sem autorização judicial, na forma do art. 5º, XI, da CF (“a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”).
HC 106566/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 9.12.2014. (HC-106566)

Busca e apreensão e autorização judicial - 2

O relator ressaltou que, embora a Constituição empregasse o termo “casa” à proteção contra a busca domiciliar não autorizada, essa proteção iria além do ambiente doméstico. O art. 150, §4º, do CP, ao definir “casa” para fins do crime de violação de domicílio, traria conceito abrangente do termo (“A expressão ‘casa’ compreende: I - qualquer compartimento habitado; II - aposento ocupado de habitação coletiva; III - compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade”). Assim, o conceito de “casa” estender-se-ia aos escritórios profissionais. Reputou que a busca e apreensão de documentos e objetos realizados por autoridade pública no domicílio de alguém, sem autorização judicial fundamentada, revelar-se-ia ilegítima, e o material eventualmente apreendido configuraria prova ilicitamente obtida. Assim, refutou o argumento de que o mandado de busca e apreensão não precisaria indicar endereço determinado. Enfatizou que a legislação processual determinaria que o mandado contivesse, precisamente, o local da diligência (CPP, art. 243). A indicação, no caso concreto, não deixara margem para dúvidas e não teria ocorrido equívoco na localização do endereço da busca. O local não seria de difícil identificação, como comumente ocorreria no meio rural. Concluiu que, desde o início, os policiais teriam identificado o 28º andar como alvo da diligência. Em seguida, pediu vista a Ministra Cármen Lúcia.

HC 106566/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 9.12.2014. (HC-106566)
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